Processo saúde-doença

Lucila Amaral Carneiro Vianna

Revisão de Celso Zilbovicius e Daniel Almeida Gonçalves

Processo saúde-doença

Muito se tem escrito sobre o processo saúde-doença, no entanto um novo instrumento intelectual para a apreensão da saúde e da doença deve levar em conta a distinção entre a doença, tal como definida pelo sistema da assistência à saúde, e a saúde, tal como percebida pelos indivíduos. Ademais, deve incluir a dimensão do bem-estar, um conceito ainda mais amplo, no qual a contribuição da saúde não é a única e nem a mais importante. O sofrimento experimentado pelas pessoas, suas famílias e grupos sociais não corresponde necessariamente à concepção de doença que orienta os provedores da assistência, como os profissionais da Estratégia Saúde da Família.

Por outro lado, como alternativa para a superação dos modelos causais clássicos, centrados em ações individuais, como os métodos diagnósticos e terapêuticos, a vacinação e a educação em saúde, ainda que dirigidos aos denominados grupos de risco, deveriam privilegiar a dimensão coletiva do fenômeno saúde-doença por meio de modelos interativos que incorporassem ações individuais e coletivas. Uma nova maneira de pensar a saúde e a doença deve incluir explicações para os achados universais de que a mortalidade e a morbidade obedecem a um gradiente que atravessa as classes socioeconômicas, de modo que menores rendas ou status social estão associados a uma pior condição em termos de saúde. Tal evidência constitui-se em um indicativo de que os determinantes da saúde estão localizados fora do sistema de assistência à saúde (EVANS; STODDART, 2003; SCHRAIBER; MENDES-GONÇALVES, 1996).

Para Gadamer, saúde e doença não são duas faces de uma mesma moeda. De fato, se considerarmos um sistema de saúde, por exemplo, o SUS, é possível verificar que as ações voltadas para o diagnóstico e o tratamento das doenças são apenas duas das suas atividades. Inclusão social, promoção de equidade ou de visibilidade e cidadania são consideradas ações de saúde. O entendimento da saúde como um dispositivo social relativamente autônomo em relação à ideia de doença, assim como as repercussões que esse novo entendimento traz para a vida social e para as práticas cotidianas em geral e dos serviços de saúde em particular, abrem novas possibilidades na concepção do processo saúde-doença.


    Dessa maneira, o processo saúde-doença está diretamente atrelado à forma como o ser humano, no decorrer de sua existência, foi se apropriando da natureza para transformá-la, buscando o atendimento às suas necessidades (GUALDA; BERGAMASCO, 2004).

Fica claro que tal processo representa o conjunto de relações e variáveis que produz e condiciona o estado de saúde e doença de uma população, que se modifica nos diversos momentos históricos do desenvolvimento científico da humanidade. Portanto, não é um conceito abstrato. Define-se no contexto histórico de determinada sociedade e num dado momento de seu desenvolvimento, devendo ser conquistada pela população em suas lutas cotidianas (GUALDA; BERGAMASCO, 2004). Assim, o conceito de saúde varia segundo a época em que vivemos, assim como os interesses dos diversos grupos sociais.

Dessa forma, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (1976), “a saúde deve ser entendida em sentido mais amplo, como componente da qualidade de vida, e, assim, não é um bem de troca, mas um bem comum, um bem e um direito social”, no sentido de que cada um e todos possam ter assegurado o exercício e a prática desse direito à saúde, a partir da aplicação e da utilização de toda a riqueza disponível, conhecimento e tecnologia que a sociedade desenvolveu e vem desenvolvendo nesse campo, adequados às suas necessidades, envolvendo promoção e proteção da saúde, prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação de doenças. Ou seja, considerar esse bem e esse direito como componente e exercício da cidadania, compreensão esta que é um referencial e um valor básico a ser assimilado pelo poder público para o balizamento e a orientação de sua conduta, decisões, estratégias e ações.

Em síntese, pode-se dizer, em termos de sua determinação causal, que o processo saúde-doença representa o conjunto de relações e variáveis que produzem e condicionam o estado de saúde-doença de uma população, que varia em diversos momentos históricos do desenvolvimento científico da humanidade.

Especialização em Saúde da Família
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