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Créditos: vastateparksstaff |
Existem diversas propostas para estabelecer quais são os critérios (o fundamento, a base) que devem nos orientar nos processos de decisão com os quais podemos nos deparar na nossa vida profissional.
Para nós, o fundamento ético é como se fosse a estrutura de um prédio. A fundação do prédio é a estrutura de concreto ou de metal que permite que a construção seja feita e que o prédio permaneça em pé. Se a estrutura não for benfeita, o prédio desaba (como aconteceu no Rio de Janeiro com os edifícios Palace I e Palace II, em que foi usada areia da praia para fazer a estrutura dos prédios, o que culminou com o desabamento dos edifícios).
O nosso fundamento ético é tão importante quanto a estrutura de um prédio. Se esse fundamento não está bem entendido, corremos o risco de não enfrentar de maneira adequada os desafios éticos que a nossa profissão pode trazer. Entretanto, uma vez compreendido esse fundamento, ele não precisa ser lembrado a todo tempo (como a estrutura de um prédio que, no final da construção, nós não vemos, mas na qual confiamos quando entramos no edifício). O fundamento ético será sempre a base para a nossa tomada de decisão. Mas qual é esse fundamento?
A pessoa humana
Para trilhar um caminho correto diante dos diversos dilemas éticos que podemos encontrar na nossa atividade profissional, precisamos de uma "base sólida", de um fundamento, que nos oriente nos momentos de decisão.
Esse fundamento é a pessoa humana.
Definir o que é a pessoa pode ser uma tarefa difícil (e que os filósofos costumam estudar arduamente), porém entender o que é a pessoa é algo que fazemos todo dia quando nos olhamos no espelho. Nós conhecemos a "pessoa humana" porque somos "pessoa humana".
Mas quais são os conceitos que existem na realidade da pessoa dos quais devemos nos lembrar por serem importantes no enfrentamento das questões bioéticas?
a) A pessoa é única. Isso significa que as pessoas são diferentes (mesmo os gêmeos idênticos são diferentes), têm suas características, seus anseios, suas necessidades, e esse patrimônio, essa identidade, merece ser respeitado (para que as pessoas não sejam tratadas como números).
Reconhecer que "o outro é diferente de mim" não significa que uma pessoa é melhor que a outra. Uma pessoa não vale mais que a outra. Somos iguais a todos no que se refere à dignidade.
b) A pessoa humana é provida de uma "dignidade". Isso significa que a pessoa tem valor pelo simples fato de ser pessoa.
c) A pessoa é composta de diversas dimensões: dimensão biológica (que as ciências da saúde, medicina, enfermagem, odontologia, fisioterapia e outras estão acostumadas a estudar), dimensão psicológica (que os psicólogos estudam detalhadamente), dimensão social ou moral (estudada pelas ciências sociais) e dimensão espiritual (estudada pelas teologias). Por isso, falamos que a pessoa é uma totalidade, pois todas essas dimensões juntas compõem a pessoa.
Quando nos relacionamos com uma pessoa e não a respeitamos em todas as suas dimensões, essa pessoa (que pode ser nosso paciente ou não) se sentirá desrespeitada e ficará insatisfeita.
Assim, todas as nossas reflexões e ações diante das pessoas (seja em situações de conflitos éticos ou não) devem ser guiadas pelo respeito a esse fundamento, a pessoa humana (entendida como um ser único, que é uma totalidade e dotado de dignidade). Quando conseguimos agir dessa maneira, ou seja, respeitando esse fundamento, podemos estar certos de que estamos agindo de forma ética.
O valor da vida humana
Outro conceito importante para construirmos a nossa reflexão ética/bioética é o de vida humana.
Para a Bioética, é fundamental o respeito à vida humana. Mas o que designamos vida humana? Segundo os principais livros de Embriologia, a vida humana inicia-se no exato momento da fecundação, quando o gameta masculino e o gameta feminino se juntam para formar um novo código genético. Esse código genético não é igual ao do pai nem ao da mãe, mas é composto de 23 cromossomos do pai e de 23 cromossomos da mãe.
Sendo assim, nesse momento, inicia-se uma nova vida, com patrimônio genético próprio, e, a partir desse momento, essa vida deverá ser respeitada. Este é o primeiro estágio de desenvolvimento de cada um de nós. A nossa experiência mostra que o desenvolvimento de todos nós se deu da mesma maneira, ou seja, a partir da união dos gametas do pai e da mãe.
Além disso, a vida é um processo que pode ser:
a) contínuo: porque é ininterrupto na sua duração. Estar vivo representa dizer que não existe interrupção entre sucessivos fenômenos integrados. Se houver interrupção, haverá a morte.
b) coordenado: significa que o DNA do próprio embrião é responsável pelo gerenciamento das etapas de seu desenvolvimento. Esse código genético coordena as atividades moleculares e celulares, o que confere a cada indivíduo uma identidade genética.
c) progressivo: porque a vida apresenta, como propriedade, a gradualidade, na qual o processo de desenvolvimento leva a uma complexidade cada vez maior da vida em formação.
Contudo, o valor da vida de algumas pessoas, em diferentes épocas, não foi respeitado (e ainda hoje, em muitos casos, não é). Por exemplo: os escravos no Brasil (até a Abolição da Escravatura, em 1888), com consequente (e ainda frequente) discriminação dos afrodescendentes; os prisioneiros nos campos de concentração na 2ª Guerra Mundial; os pacientes com necessidades especiais (como os portadores do vírus HIV em diversas situações); as mulheres e os pobres em diversas sociedades (inclusive na nossa), dentre tantos outros exemplos.