Esse caso aborda o manejo de um caso clínico de infecção respiratória em uma paciente idosa institucionalizada. Como a paciente não apresentava sinais de agravamento ou de descompensação de doença de base, o processo é conduzido inicialmente como um caso de síndrome gripal, sendo indicado corretamente o tratamento com oseltamivir e optado pelo manejo ambulatorial. Na evolução clínica a paciente se agrava, passando a apresentar dispneia e quadro sugestivo de sepse (AMIB, 2004). Como a administração do antiviral foi iniciada no tempo correto, a piora clínica apresentada pode indicar a presença de outro agente etiológico ou de resistência ao antiviral. No retorno, a paciente apresenta um quadro de pneumonia grave e é internada em unidade de terapia intensiva. A gravidade do caso é justificada pela presença de confusão mental, taquipneia, taquicardia, elevação de ureia, hiponatremia, hipoalbuminemia, em uma paciente com mais de 65 anos de idade, residente em instituição de cuidados prolongados. Escores como o CURP-65, PORT/PSI e SMART-COP podem auxiliar o médico na estratificação de risco de pacientes com pneumonia (Lim et al, 2003; Aujesky et al, 2005; Charles et al, 2008).
Os agentes mais frequentemente envolvidos na situação apresentada são S. pneumoniae, M. pneumoniae, C. pneumoniae, Legionella sp., H. influenzae, além dos vírus respiratórios (Correa et al, 2009). A associação de infecção por influenza e pneumonia por S. aureus também tem sido descrita (Rothberg, 2008) e deve ser considerada na seleção do melhor esquema antimicrobiano. Dessa forma, o manejo adequado do caso clínico apresentado envolve a manutenção do antiviral já iniciado na primeira consulta com acréscimo de antibióticos. O melhor esquema antimicrobiano nessa situação, indicado pelo protocolo da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (Correa, 2009), seria composto de cefalosporina de 3ª geração e macrolídeo.
Com a paciente sendo submetida à ventilação mecânica, o oseltamivir passa a ser administrado por sonda, conforme recomendado pela Organização Mundial da Saúde - OMS (2010) e pelo Ministério da Saúde (2013). Para administração do oseltamivir por sonda nasogástrica, a cápsula deve ser cortada e o seu conteúdo diluído em água, misturando-se bem. Devido à insuficiência respiratória e à administração da medicação por sonda nasogástrica, a dose do oseltamivir é dobrada. A estimativa do clearance de creatinina, particularmente em pacientes idosos, é importante para avaliação de eventual necessidade de ajuste de dose. Por tratar-se de medicação de excreção renal, deve-se reduzir a dose em pacientes com clearance de creatinina menor que 30 ml/min (Roche, 2009).
Ao final do caso, os exames confirmam tratar-se de caso de influenza. A coleta de secreção respiratória está indicada em casos de pacientes hospitalizados com síndrome respiratória aguda grave (SRAG), independentemente da idade. Apesar das hemoculturas não terem evidenciado crescimento bacteriano, a paciente pode ter apresentado coinfecção ou superinfecção por algum agente bacteriano.
Por fim, destaca-se a discussão sobre quimioprofilaxia em instituições asilares. A quimioprofilaxia de outras idosas e também de funcionários do asilo deveria ter sido avaliada individualmente logo após a avaliação inicial da D. Maria Aparecida. O protocolo do Ministério da Saúde (2013) preconiza a quimioprofilaxia para pessoas com risco elevado de complicações, não vacinadas (ou vacinadas há menos de duas semanas), após exposição a caso suspeito ou confirmado de influenza. A quimioprofilaxia (H: 6) é também recomendada para controlar surtos entre pessoas com alto risco de infecção em ambientes institucionais em casos de surto suspeito ou confirmado. Como não ocorreram outros casos na situação apresentada, a quimioprofilaxia não foi indicada, devendo-se vacinar contra a influenza as idosas e funcionárias ainda não vacinadas. A quimioprofilaxia é recomendada apenas no intervalo de 48 horas após a última exposição.
Em relação à proteção contra agravos respiratórios, vale a pena ressaltar que todo paciente com 60 anos ou mais deve receber, além da vacinação anual contra influenza, também a vacina pneumocócica 23-valente, em dose única.
REFERÊNCIAS
- AMIB – Associação de Medicina Intensiva Brasileira. I Consenso Brasileiro de Sepse Disponível em http://goo.gl/dp5aV. Ultimo acesso em 18/04/2013.
- Aujesky D, Auble TE, Yealy DM et al. Prospective comparison of three validated prediction rules for prognosis in community-acquired pneumonia. Am. J. Med., 2005; 118 (4): 384–92.
- Charles PG, Wolfe R, Whitby M, Fine MJ, Fuller AJ, Stirling R, et al. SMART-COP: a tool for predicting the need for intensive respiratory or vasopressor support in community-acquired pneumonia. Clin Infect Dis, 2008; 47(3):375-84.
- Corrêa, RA, Lundgren FLC, Pereira-Silva JL et al. Diretrizes brasileiras para pneumonia adquirida na comunidade em adultos imunocompetentes – 2009. J Bras Pneumol. 2009;35(6):574-601.
- Lim W, van der Eerden MM, Laing R, Boersma W, Karalus N, Town G, Lewis S, Macfarlane J. Defining community acquired pneumonia severity on presentation to hospital: an international derivation and validation study. Thorax. 2003 May; 58(5): 377–382.
- Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Protocolo de Tratamento de Influenza – 2013. Brasília: Ministério da Saúde, 2013.
- Organização Mundial da Saúde. WHO Guidelines for Pharmacological Management of Pandemic Influenza A(H1N1) 2009 and other Influenza Viruses – Revised February 2010. Disponível em http://goo.gl/VFpHr. Ultimo acesso em 28/03/2013
- Rothberg, MB, Haessler, SD, Brown, RB. Complications of viral influenza. The American Journal of Medicine, 2008; 121: 258-264
- Roche Laboratories Inc. Tamiflu (oseltamivir phosphate) capsules and oral suspension [package insert]. Nutley, NJ: Roche laboratories, Inc.; 2009.
- Taylor WRJ, Thinh BN, Anh GT, Horby P, Wertheim H, et al. Oseltamivir Is Adequately Absorbed Following Nasogastric Administration to Adult Patients with Severe H5N1 Influenza. PLoS ONE, 2008; 3(10): e3410