Aprenda sobreResponsabilidades Gestoras no Último Ano de Mandato

Condutas Vedadas Legalmente

Transferências Voluntárias

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As Transferências Voluntárias no Último Ano do Mandato

A celebração de termos de cooperação visando às chamadas transferências de recursos, voluntárias ou não, entre os entes federados é de relevância, haja vista que a realidade da maioria dos entes municipais brasileiros, depende, quase que exclusivamente, desses termos.

Para melhor entendimento dos comandos constitucionais, é necessário fazer distinções entre as diversas formas de transferência, a saber:

Transferências Voluntárias: são os recursos financeiros repassados pela União aos Estados, Distrito Federal e Municípios em decorrência da celebração de convênios, acordos, ajustes ou outros instrumentos similares, cuja finalidade é a realização de obras e/ou serviços de interesse comum. A Transferência Voluntária é a entrega de recursos a outro ente da Federação, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Transferências Intragovernamentais: feitas no âmbito de cada governo. Podem ser a autarquias, fundações, fundos, empresas e a outras entidades autorizadas em legislação especifica.

Transferências Intergovernamentais: feitas entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

• Transferências Constitucionais: previstas na Constituição Federal, de parcelas das receitas federais arrecadadas pela União e que devem ser repassadas aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. O objetivo do repasse é amenizar as desigualdades regionais e promover o equilíbrio socioeconômico entre Estados e Municípios. Dentre as principais transferências da União para os Estados, o DF e os Municípios, previstas na Constituição, destacam-se: o Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE); o Fundo de Participação dos Municípios (FPM); o Fundo de Compensação pela Exportação de Produtos Industrializados (FPEX); o Fundo de Manutenção e de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF); e o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR).

Transferências destinadas ao Sistema Único de Saúde (SUS): são transferências tratadas separadamente por conta da relevância do assunto, por meio da celebração de convênios, de contratos de repasses e, principalmente, de transferências fundo a fundo. O SUS compreende todas as ações e serviços de saúde estatais das esferas federal, estadual, municipal e distrital, bem como os serviços privados de saúde contratados ou conveniados. Os valores são depositados diretamente do Fundo Nacional de Saúde aos fundos de saúde estaduais, municipais e do Distrito Federal. Os depósitos são feitos em contas individualizadas, isto é, específicas dos fundos.

Transferências Legais: são as parcelas das receitas federais arrecadadas pela União, repassadas aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, previstas em leis específicas. Essas leis determinam a forma de habilitação, a transferência, a aplicação dos recursos e como deverá ocorrer a respectiva prestação de contas. Dentre as principais transferências da União para os Estados, o DF e os Municípios, previstas em leis, destacam-se: o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), o Programa Nacional de Apoio ao Transporte do Escolar (PNATE), o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), o Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para Atendimento à Educação de Jovens e Adultos, entre outros.

É importante ressaltar, para melhor entendimento e fixação, a partir das diferenciações acima mencionadas que:

Transferências Constitucionais estão relacionadas aos FUNDOS;

Transferências Legais estão relacionadas aos PROGRAMAS.

Por meio da celebração desses termos jurídicos com escopo econômico financeiro torna-se possível a complementação e atingimento das ações estatais pelos entes federados e previstos no ordenamento constitucional republicano.

Entretanto, o calendário administrativo depara-se, a cada quadriênio, com a realização de pleito municipal.

É sobre esse período que nos debruçaremos, o último ano de mandato, para abordarmos, de forma sucinta, as implicações existentes e aplicáveis à administração pública municipal, acerca das chamadas transferências voluntárias.

O legislador colocou a salvo, todas as atividades relativas ao cotidiano da administração pública e que não podem sofrer paralizações, tendo em vista a sua natureza continuada, visto que, como diz o ditado popular administração pública não dorme.

Nesse sentido o Tribunal Superior Eleitoral, através da Resolução nº 23.457/2015/TSE, art. 62, VI, “a”, que determinou:

“Art. 62. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais (Lei nº 9.504/1997, art. 73, incisos I a VIII)

VI - a partir de 2 de julho de 2016 até a realização do pleito:

a) realizar transferência voluntária de recursos da União aos Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para a execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública;

Por conseguinte, as transferências voluntárias advindas de celebração de instrumentos jurídicos celebrados anteriormente ao ano eleitoral e constantes das ferramentas orçamentárias (Lei Orçamentária, Lei de Diretrizes Orçamentárias e Plano Plurianual) não poderão sofrer nenhuma interrupção na transferência de valores, haja vista os compromissos assumidos pelo ente federado com terceiros e decorrentes de procedimentos licitatórios.

Assim, a administração pública deverá, quanto a TRANSFERÊNCIAS VOLUNTÁRIAS, de forma acautelatória, observar:

1-) Período de Incidência de Condutas Vedadas em Ano Eleitoral Relativamente à Realização de Procedimentos Licitatórios.

• A Partir de 02 DE JULHO DE 2016 até a realização das eleições.

2-) Penalidades pelo Descumprimento às Condutas Vedadas na Realização de Eventos Licitatórios em Ano Eleitoral.

O Decreto Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967, que dispõe sobre a responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores e dá outras providências prevê:

“Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipais, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores:

XXIII – realizar ou receber transferência voluntária em desacordo com limite ou condição estabelecida em lei. (Incluído pela Lei 10.028, de 2000)

§1º Os crimes definidos neste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos.”

A jurisprudência expedida pela Corte Eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral – TSE, acerca das penalidades impostas aos agentes políticos pelo descumprimento das regras postas a cumprir no último ano de mandato, nas mais diversas situações, como transcrito abaixo, assim se posicionou:

“[...] Convênios. Transferências voluntárias às prefeituras. Violação ao art. 73 da Lei 9.504/97. Abuso de poder político. Configuração. Declaração de inelegibilidade e exclusão do fundo partidário. Perda de objeto. Aplicação de multa. Recurso não provido. [...] III - As transferências voluntárias em período pré-eleitoral sem os requisitos legais configuram conduta proibida pela Lei 9.504/97. [...]”

(Ac. de 18.6.2009 no RO nº 841, rel. Min. Ricardo Lewandowski.)

[...] Ação de investigação judicial eleitoral. Realização de obra no período eleitoral. Abuso do poder político e de autoridade (art. 73, VI, a, da Lei no 9.504/97). Não-comprovação. Reexame. Impossibilidade. [...] – A vedação do art. 73, VI, a, da Lei no 9.504/97 compreende a transferência voluntária e efetiva dos recursos nos três meses que antecedem o pleito, ressalvado o cumprimento de obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e, ainda, os casos de atendimento de situações de emergência e de calamidade pública. [...]”

(Ac. de 15.2.2007 no AgRgREspe no 25.980, rel. Min. Gerardo Grossi.)

[...] É vedada à União e aos estados, nos três meses que antecedem o pleito, a transferência voluntária de verbas, ainda que decorrentes de convênio ou outra obrigação preexistente, desde que não se destinem à execução de obras ou serviços já iniciados. [...]”

(Res. no 22.284, de 29.6.2006, rel. Min. Caputo Bastos.)

“Consulta. Eleições 2004. Impossibilidade de transferência de recursos entre entes federados para execução de obra ou serviço que não esteja em andamento nos três meses que antecedem o pleito. Incidência da vedação do art. 73, VI, a, da Lei no 9.504/97. Decisão referendada pela Corte.”

(Res. no 21.878, de 12.8.2004, rel. Min. Carlos Velloso.)

O Tribunal de Contas da União, AC-1989-43/06-P, Processo 018.233/2006-1, Rel. Valmir Campelo, acerca de transferência voluntária, decidiu, ipsis litteris:

Acórdão: VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Representação acerca de irregularidades no repasse de R$ 8.381.818,22 (oito milhões, trezentos e oitenta e um mil, oitocentos e dezoito reais e vinte e dois centavos) ao Governo do Estado do Piauí à conta do Convênio nº 4505/2005, celebrado entre o Ministério da Saúde e a Secretaria de Estado da Saúde do Piauí, tendo por objeto a aquisição de unidades móveis de saúde.

9.2. rejeitar as razões de justificativa apresentadas pelo Sr. José Menezes Neto, Diretor-Executivo do Fundo Nacional de Saúde, tendo em conta que os argumentos oferecidos não foram suficientes para elidir a irregularidade concernente à transferência, em 10/07/2006, de R$ 8.381.818,22 ao Governo do Estado do Piauí, com infração ao inciso VI, alínea “a”, do artigo 73 da Lei nº 9.504/97;

9.3. aplicar ao Sr. José Menezes Neto, com fundamento no art. 58, inciso II, da Lei nº 8.443/92, c/c o art. 268, inciso II, do Regimento Interno, multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), fixando-lhe o prazo de quinze dias, a contar da notificação, para que comprove, perante o Tribunal, o recolhimento da referida quantia aos cofres do Tesouro Nacional, atualizada monetariamente e acrescida dos juros de mora a partir do dia seguinte ao do término do prazo estabelecido até a data do efetivo recolhimento, na forma da legislação em vigor;

FUMAÇA DO BOM DIREITO

16. De fato, não há maiores dificuldades em se constatar que o objeto conveniado, aquisição de unidades móveis de saúde, não é obra ou serviço em andamento, mas mera aquisição de material permanente.

20. Por fim, cumpre analisar que medida administrativa deve ser adotada diante da flagrante ilegalidade do repasse de R$ 8,3 milhões.

21. De acordo com o multicitado dispositivo legal, as transferências voluntárias ocorridas no período eleitoral padecem de "nulidade de pleno direito" caso não estejam amparadas pelas exceções legais.

22. Por "nulidade de pleno direito", há que se entender que o ato ilícito descrito não pode gerar qualquer efeito prático, ou seja, as aquisições de ambulâncias não podem ocorrer no período eleitoral e os recursos repassados à Secretaria de Saúde do Piauí deveriam retornar aos cofres federais para serem liberados depois das eleições.

DECLARAÇÃO DE VOTO (ainda é do AC-1989-43/06-P sim. É parte da decisão transcrita).

Considero que a vedação contida no art. 73, VI, a, da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997 abrange os pleitos eleitorais de todos os entes da federação, inclusive a União. Para melhor expor o meu entendimento sobre a matéria, transcrevo, no que releva, o mencionado normativo.

Da análise do caput, verifica-se que o bem jurídico tutelado pelo referido art. 73 é a isonomia entre os candidatos nas eleições. Quis o legislador coibir a utilização do aparato estatal como instrumento de promoção pessoal em qualquer pleito eleitoral.

8. Ressalto aqui que o contexto político em que foi realizada a Consulta nº 1.062 era o das eleições municipais de 2004. Nesse sentido a decisão proferida pelo Ministro Sepúlveda Pertence, posteriormente referendada pelo Tribunal Superior Eleitoral -TSE por intermédio da Resolução-TSE nº 21.878/04, faz referências expressas ao citado pleito. .....

42. De tudo, ad referendum do Tribunal, respondo negativamente à consulta para assentar que, por força do disposto no art. 73, VI, a, da L. 9504/97, é vedado à União e aos Estados, até as eleições municipais, a transferência voluntária de recursos aos Municípios - ainda que constitua objeto de convênio ou de qualquer outra obrigação preexistente ao período - quando não se destinem à execução já fisicamente iniciada de obras ou serviços, ressalvadas unicamente as hipóteses em que se faça necessária para atender a situação de emergência ou de calamidade pública." (grifei) (grifamos)

COMO CUMPRIR O COMPROMISSO

Os agentes políticos devem observar, durante toda a gestão e, não somente, no último ano de mandato, as leis que incidem sobre a gestão da administração pública municipal. Dessa forma, cabe destacar:

• a necessidade da existência de plano de carreiras estruturado que reflita o cumprimento das normas e, em especial, o comando contido na Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal);

• a observância na realização de procedimentos licitatórios que reflitam a real demanda da administração e, em contrapartida, contratos que contemplem preços e condições mais vantajosas para o Erário;

• a prática de atos administrativos em consonância com os preceitos constitucionais aplicáveis à administração pública (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência) cuidando, enfim, da res publica como deve ser cuidada.

BEM PÚBLICO É BEM COMUM E BEM NENHUM. PERTENCE A TODOS NÓS E NÃO É DE NINGUÉM. O instrumento de referência para sua realização é a PROBIDADE que todo agente político deve empreender aos atos praticados.

E SE PERDER O PRAZO POSSO CORRIGIR COMO? AINDA NO ANO FISCAL?

Os atos, sejam eles quais forem, independentemente do lapso temporal, poderão ser revistos. Dessa forma, os atos praticados nos dois últimos quadrimestres do último ano de mandato, se estiverem em desacordo com as normas, deverão ser revistos, acautelando-se, desta maneira, o agente político, evitando, por conseguinte, a aplicação de penalidades deles decorrentes.

Se, todavia, as referidas práticas forem lesivas ao Erário e/ou aos direitos dos interessados/lesados, ainda que referidos atos sejam revistos, haverá efeitos e, certamente, reflexos nos interesses de terceiros, públicos e/ou privados. Nesse sentido, mesmo depois de corrigidos os referidos atos, sua revisão não elimina a possibilidade de demanda judicial a fim de restaurarem-se direitos lesados. E, decidindo o Poder Judiciário da ocorrência da lesão/dano através de sentença/acórdão, o agente político que lhe deu causa, poderá ser responsabilizado civil, criminal e administrativamente.

Referências Bibliográficas

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CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2014.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2014.