Ilha das Flores
 Menu
Marcelo Marcos Piva Demarzo, Lucilia de Fatima Auricchio e Julie Silvia Martins
Revisão de Daniel Almeida Gonçalves




Contextualização

Eixo 1 - Gestão

A situação das famílias e das pessoas apresentada neste caso, bem como a descrição do trabalho dos profissionais, nos possibilita uma ampla discussão no que diz respeito a organização do trabalho e do processo saúde doença.

Ambas as famílias apresentam uma significante vulnerabilidade social e vivem e trabalham em condições insalubres. Isso é percebido pela agente de saúde, que traz os problemas para a equipe. Vamos discutir como a equipe se comporta mediante as situações apresentadas e os pontos de destaque:

O trabalho em equipe

Primeiramente, vale a pena notar a organização do trabalho desta equipe. Reúnem-se diariamente por uma hora, para discussão dos casos trazidos pelos ACS. Muitas equipes têm arranjos diferentes para reunirem-se, mas este espaço é fundamental para organização do trabalho em equipe, tal como vimos no caso. Observe que a dentista Juliana, por estar na reunião de equipe, sabia da situação da família e priorizou seu atendimento, ajudando no enfrentamento do problema do atraso vacinal da Stefane e pronto apoio a solicitação do Dr. Marcelo como estratégia de estreitamento de vínculo e organização de planos de cuidados para "famílias de risco". Esta equipe também utiliza rotineiramente as fichas do SIAB, o que notadamente facilita o processo de trabalho.

Na descrição do caso, observa-se também um momento de tensão, quando a agente de saúde questiona o médico sobre a família que havia visitado. Como trabalhar aspectos da comunicação entre os componentes da equipe constitui-se também numa questão fundamental. Problemas como falta de tempo, sobrecarga de trabalho (como podem ser lidos no tema "Acidente de trabalho") tornam-se importantes e tendem a ser deixados de lado. Recomendações:

Vale a pena destacar alguns princípios da Atenção Primária presentes no caso. A agente de saúde se incomodou com o médico por este não se lembrar da situação da Josélia. Por estar lá somente há um ano, não conseguia lembrar-se de todas as pessoas, argumentou Marcelo. Já a Enfermeira Elza, há mais tempo na equipe, sabia de quem se tratava. Aqui observamos um exemplo da importância da longitudinalidade do cuidado na APS. Conhecer as pessoas ao longo do tempo facilita não só a organização do trabalho do profissional, mas também garante maior satisfação e adesão dos usuários. E aí reside um problema grave enfrentados pela Estratégia Saúde da Família na atualidade, dado a alta rotatividade dos médicos. A equipe também garantiu, acertadamente, que fosse facilitado o acesso de todos os membros da família de Josélia, tentando equilibrar a demanda espontânea com a programada, como será discutido a seguir.

Gestão da clínica em equipe

Uma questão evidente que surge do caso é o impasse da necessidade de equilibrar "consulta programada" X "tempo de consulta" X "fator surpresa" (consulta programada e demanda eventual/espontânea no meio). Não existe apenas uma resposta para essa pergunta, e o mais importante é a própria equipe discutir e chegar a consensos sobre como organizar a agenda e as atividades para atender às necessidades daquela comunidade. Uma maneira harmoniosa de conviver com essas "surpresas" é incorporar a flexibilidade com o tempo, aprimorar as técnicas de abordagem ambulatorial e utilizar os princípios do método clínico centrado na pessoa. É fundamental valorizar outras formas de atenção às pessoas, como o trabalho com grupos e lideranças comunitárias, e o incentivo à qualificação clínica da equipe de saúde.

No que diz respeito a consulta do Reinaldo, nota-se em primeira instância a sensibilidade do Dr Marcelo em perceber que Josélia trouxe também o marido, por ele não estar bem, entretanto nota-se também o estresse do médico em ter de escolher um dos dois para uma consulta mais completa, considerando que tem muitas consultas agendadas. É claro que o ideal é que ambos recebessem avaliação clínica completa, entretanto, na prática clínica, frequentemente nos deparamos com uma demanda muito grande, em que há necessidade de escolhas, a partir de prioridades. Marcelo consegue trabalhar com prioridades, uma vez que define priorizar a atenção a Reinaldo em função do seu quadro agudo (de urgência). E, embora não tenha conseguido realizar uma consulta completa do quadro crônico de Josélia, não deixa de prestar o atendimento, uma vez que realiza o acolhimento, explicando sua decisão e realizando condutas pontuais e encaminhamentos pertinentes, a fim de que ela possa ser avaliada em outro momento, lançando mão da longitudinalidade do cuidado, também de forma completa.

A consulta de Marcelo foi objetiva, porém acolhedora, considerando a execução de perguntas abertas: "Como posso ajudar você, Reinaldo?", além da abordagem dos sentimentos do paciente: "Por que você ficou com medo?". A avaliação clínica de Marcelo é tecida de uma forma evolutiva e tranquila, englobando todas as queixas clínicas apresentadas por Reinaldo (feridas na boca e lábios e ferimento no pé), avaliação de fatores de risco e orientações/informações importantes.

Observamos aqui que Marcelo realizou uma abordagem centrada na pessoa, uma vez que fez questionamentos abertos. Buscando entender o que realmente preocupava Reinaldo, investigou como ele se sentia doente e, finalmente, foi realista na consulta.

Nesse sentido, a Enfermeira Elza não foi muito "feliz" ao se comunicar de forma agressiva e repreensiva a Josélia, não entendendo o sofrimento causado pela ferida e observando somente o estado da lesão (ferida "linda" no passado X péssimo estado atual).

A dentista Juliana teve grande participação ao aceitar avaliar os casos e se lembrar da reunião de equipe e abordar também o estado vacinal, depois da criança ter sido trazida pela auxiliar de enfermagem. Observa-se aqui o potencial do trabalho em equipe. Todo encontro da equipe de saúde com os usuários deve ser um momento de cuidado, inclusive incorporando a prevenção de doenças e promoção de saúde (outro passo da abordagem centrada na pessoa).

Especialização em Saúde da Família
Copyright 2012|UnA-SUS UNIFESP