O caso das duas famílias em questão traz à tona uma discussão importante: o atendimento de urgência nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). O "acolhimento", ou "demanda", ou "eventual", entre outras denominações, é de vital importância para o bom funcionamento do processo de trabalho de uma Unidade Básica de Saúde. É visto pela população (que tem os sintomas agudos ou necessidades "urgentes") como a principal vitrine da UBS, e a equipe, que se vê perante um trabalho não programado, tem que estar organizada para seu enfrentamento.
Tendo em vista os princípios da Atenção Primária, em especial a Acessibilidade/Primeiro Contato, uma UBS deve estar preparada para lidar com a demanda espontânea da população. No que se refere às demandas espontâneas por trauma, as limitações de uma unidade são grandes, em especial em traumas que requerem maior tecnologia para ser abordados (exames de imagem, laboratoriais, avaliação especializada). No entanto, a equipe deve estar preparada para dar o primeiro atendimento e acionar serviços de emergência médica, como o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU 192). No caso apresentado, temos dois exemplos dessa situação: Gerson e Reinaldo. Vamos nos aprofundar no caso de Reinado, no qual duas situações se destacam:
Há grande risco de doenças infecto-contagiosas. Do ponto de vista cirúrgico, existe também o risco de infecção bacteriana – que aumenta em portadores de doenças imunodepressoras, desnutridos, alcoolistas e tabagistas. Cuidados locais, como lavar bastante com água e sabonete e manter curativo limpo, são fundamentais. Ao menor sinal de infecção (calor, rubor, edema e dor progressiva), deve-se entrar com antibioticoterapia para gram positivo durante sete dias. Deve-se associar lavagem local com solução degermante de PVPI ou Clorexidina, ou cobertura à base de prata ou hidrogel. A situação vacinal para tétano também deve ser checada.
Marcelo dá o diagnóstico de erisipela. Podemos pensar também na celulite como diagnóstico diferencial. Como diferenciar e qual o tratamento nesse caso?
Bem, a erisipela e a celulite são bastante semelhantes quanto à origem. Quando abrimos um ferimento na pele, há exposição dos tecidos aos germes do meio externo. As infecções mais comuns são aquelas que ocorrem por bactérias que vivem naturalmente na nossa pele e se aproveitam para invadir o organismo. Se não tratadas adequadamente, essas bactérias invasoras podem migrar para outras regiões do corpo como a corrente sanguínea e órgãos internos. A grande diferença entre a erisipela e a celulite é o local onde a bactéria se aloja e causa a infecção. Na erisipela, a infecção se dá nas camadas mais próximas do exterior, acometendo a epiderme e a camada mais superficial da derme. Já a celulite é uma infecção mais profunda, infectando o tecido gorduroso na hipoderme e a camada profunda da derme. No quadro clínico, ambas as lesões são muito semelhantes e, às vezes, difíceis de ser distinguidas.
Tanto a erisipela quanto a celulite se apresentam clinicamente como uma infecção da pele, ou seja, com rubor (vermelhidão), calor local, intensa dor e edema (inchaço) no local acometido.
Como a erisipela é uma infecção mais superficial que a celulite, algumas características ajudam no diagnóstico diferencial. Na erisipela, a lesão costuma apresentar um discreto relevo e suas bordas são muito nítidas. Ao se examinar a pele, é fácil saber onde começa e onde termina a infecção. A delimitação entre pele doente e pele sã é clara.
A celulite, como acomete tecidos mais profundos, não apresenta sinais tão claros na pele. A lesão costuma ser mais difusa e nem sempre é possível saber exatamente onde começa e onde termina a infecção. Na erisipela, os sintomas sistêmicos como febre, suores e calafrios costumam aparecer precocemente, assim que surgem os primeiros sinais de infecção na pele. Na celulite, o quadro costuma ser mais arrastado, primeiro aparecendo a lesão e só depois de alguns dias é que surge a febre. Outros sintomas da infecção podem ser perda do apetite, náuseas, vômitos, mal-estar, inapetência e dores de cabeça. A erisipela costuma ocorrer mais em crianças e idosos, enquanto a celulite é mais comum em adultos acima dos 50 anos. Os membros inferiores são os locais mais acometidos tanto na erisipela quanto na celulite.
Nos quadros mais graves, a infecção torna-se mais difusa, e a distinção entre as duas doenças torna-se mais difícil. Alguns sinais de gravidade incluem a formação de bolhas, úlceras e necrose da pele. Quadros graves podem evoluir para osteomielite. Outra complicação é a endocardite. Se não tratadas, a celulite e a erisipela podem evoluir para sepse com elevado risco de morte para o paciente.
O caso do Reinaldo é uma entorse grau 1 (estiramento leve). No entanto, o maior desafio é conscientizá-lo da necessidade momentânea de repouso (ao menos três dias). Além disso, imobilização local, gelo e anti-inflamatórios não esteroides (AINE) ou analgésico devem ser prescritos para alívio sintomático e prevenção de cronificação da inflamação.