Cuidado
Para termos uma visão inicial mais sistêmica do caso apresentado, devemos ter um olhar ampliado sobre a situação do Jéferson.
Cuidando de Jéferson
Jéferson possui vários sinais e sintomas, referidos na procura por atendimento ou observados pela equipe, que devem ser avaliados e cuidados integralmente, de forma articulada. A questão mais importante para a equipe de saúde é a dependência por drogas e o risco de tuberculose; mas os outros problemas não devem ser negligenciados uma vez que são a prioridade de Jéferson e porque estão, de alguma forma, relacionados com a drogadição e podem, se bem conduzidos, promover o vínculo e a confiança necessários para a abordagem sobre o uso de substâncias, a qual é bastante complexa. O acesso ao tratamento de ferimentos agudos e a abordagem dos problemas odontológicos pode, por exemplo, configurar-se num caminho adequado para o fortalecimento do vínculo (veja mais no tema Saúde bucal).
Dor abdominal e urina escura podem fazer parte das características clínicas da hepatite viral aguda. A febre não é tão comum. É importante pensar que os quadros clínicos agudos das hepatites virais são muito diversificados, variando desde formas subclínicas ou oligossintomáticas até formas fulminantes. A maioria dos casos cursa com predominância de fadiga, anorexia, náuseas, mal-estar geral e adinamia. Nos pacientes sintomáticos, o período de doença aguda se caracteriza pela presença de colúria, hipocolia fecal e icterícia. Todos esses aspectos poderiam ter sido abordados pela médica e pela equipe para melhor definição do diagnóstico, além da solicitação dos exames complementares.
A tosse acompanhada do emagrecimento, como no caso de Jéferson, pode ser provocada pelo uso de crack, mas é importante pensar na possibilidade de detecção da tuberculose, como veremos no tema Tosse crônica e tuberculose.
Em relação à dependência, as abordagens iniciais e continuadas devem buscar alguns objetivos principais:
1) Determinar se Jéferson atende aos critérios clínicos para dependência ou abuso de álcool/drogas;
2) Determinar a gravidade do problema;
3) Determinar como a droga afeta a saúde física e psicológica e as relações familiares e sociais de Jéferson.
Casos como o de Jéferson exigem um cuidado integrado com os diversos equipamentos comunitários e de saúde disponíveis, articulando vários profissionais. Desde uma articulação dos profissionais da própria equipe de saúde na família, lançando mão de todos os princípios da Atenção Primária, bem como de outros profissionais ou níveis do sistema. Cuidados colaborativos entre vários profissionais e seus conhecimento e habilidades têm sido descritos como uma alternativa válida e preciosa para enfrentamento de situações como esta. No nosso meio, os profissionais do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) compõem apoio possível, seja para atendimento compartilhado de Jéferson ou mesmo para avaliação individual e articulação com profissionais especialistas na abordagem de dependência química, do CAPS AD por exemplo. Cada profissional da equipe assume um papel no apoio a Jéferson, na busca de objetivos pactuados entre a equipe e, idealmente, com a pessoa e família em questão. Aqui o trabalho em equipe ganha destaque, compondo o Projeto Terapêutico Singular, que será apresentado formalmente em unidades futuras neste curso. Neste sentido uma cuidadosa aproximação deve ser feita aos familiares do Jéferson. A abordagem da família configura-se em uma das estratégias possíveis para apoio à problemática do jovem.
Como na equipe há um profissional capacitado para redução de danos, tal estratégia deve ser considerada no plano terapêutico. A redução de danos é um conjunto de ações de saúde dirigidas a usuários ou a dependentes que não podem, não conseguem ou não querem interromper o referido uso, tendo como objetivo reduzir os riscos associados sem, necessariamente, intervir na oferta ou no consumo. É uma das estratégias usadas na Atenção Básica para trabalhar no acompanhamento de usuários de drogas e álcool, como veremos no tema Abordagem da dependência química.
O tema da dependência química é tratado no curso do SUPERA, da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas/SENAD e UNIFESP. O SUPERA orienta a aplicação de entrevista padronizada (ASSIST) que auxilia o profissional à classificação da relação do usuário com a droga bem como capacita para aplicação de intervenções breves na Atenção Primária. Mais informações em http://www.supera.org.br/senad/.
A Equipe de Saúde da Família pode, portanto, trabalhar com a redução de danos neste caso – por exemplo – através da educação, informação e aconselhamento; assistência social e à saúde; disponibilização de insumos de proteção à saúde e de prevenção ao HIV/AIDS e às hepatites.