Unidade 12 - Vila Santo Antônio
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Thiago Marques Fidalgo, Pedro Mário Pan Neto e Dartiu Xavier da Silveira


Abordagem da dependência química

O caso do paciente Jéferson tem como elemento central a dependência química. Trata-se de um problema bastante prevalente, porém pouco debatido ao longo da formação dos profissionais de saúde, o que faz com que dúvidas quanto ao seu manejo sejam frequentes.

Vários pontos importantes são suscitados pela reunião clínica. O primeiro é a mobilização que o caso gera na equipe. Todos parecem angustiados com os problemas de Jéferson, mas sem saber exatamente como lidar com a situação. É interessante, também, o fato de Jéferson chegar "exigindo" atendimento naquele momento. Qual seria a postura adequada? Atender à "exigência"? Colocar limite? Por fim, temos a questão sobre o papel da Unidade Básica de Saúde no atendimento aos dependentes químicos.


É bastante comum que pacientes dependentes químicos sejam encarados pelos profissionais de saúde como "pacientes difíceis" ou que "não têm vontade de se tratar". Essa postura estigmatiza o paciente e dificulta a busca por tratamento. É importante ressaltar que a dependência é uma questão de saúde, que deve ser abordada por todos os níveis de atenção. Dessa forma, é importante que esse assunto seja discutido por todos que compõem a equipe dos serviços, desde os técnicos até os profissionais de base, como porteiros e auxiliares de limpeza. Todos são responsáveis por acolher o paciente e por motivá-lo a manter o tratamento.

Fica claro, assim, que faz parte das atribuições da Unidade Básica de Saúde a atenção a esses pacientes. Certamente as UBS não dispõem de toda a infraestrutura necessária para o atendimento completo de dependentes como Jéferson, a começar por uma equipe multiprofissional completa, que conte com terapeuta ocupacional, psiquiatra, psicólogo e assistente social. A UBS, no entanto, em função de sua capilaridade e de sua inserção no território, tem importante papel na conscientização da população quanto à identificação dos casos que necessitam de ajuda. Além disso, em todo atendimento, os pacientes poderiam ser avaliados com instrumentos de rastreamento para dependência. Por fim, a equipe da UBS pode agir de forma bastante eficaz na prevenção do uso indevido de substâncias.

É importante que a Unidade esteja preparada para acolher a angústia de Jéferson a qualquer momento do dia. Esse acolhimento pode ser feito por qualquer profissional da saúde. Por outro lado, ao mesmo tempo que essa angústia emergencial deve ser acolhida, é importante que ela não seja o motor do tratamento. Limites e regras devem sempre ser estabelecidos e lembrados a Jéferson o tempo todo, como forma de auxiliá-lo no desenvolvimento de uma relação com a instituição que seja diferente daquela estabelecida com a substância, na qual todos os seus desejos e angústias são prontamente atendidos e aliviados. Nesse sentido, é de importância vital que a equipe atue de forma coesa, com o discurso afinado, orientando o paciente de forma única e sistematizada. Esses contornos, que podem ser encarados como limitadores, são, na verdade, as ferramentas de que dispõe a equipe para dar forma à demanda do paciente, que, na maioria das vezes, se encontra fragmentada e ambivalente.

Redução de danos

Ao longo do caso do paciente em questão, fica claro que as estratégias habituais para o tratamento da dependência química não se mostraram aplicáveis. A Redução de Danos surge como um paradigma possível tanto no plano individual quanto no ambiente comunitário.


Diversas dificuldades foram encontradas ao longo do manejo clínico do caso. Nesse momento, com o respaldo da literatura disponível, poderia se optar pelo paradigma da Redução de Danos como norteador das ações. Dessa forma, não mais se buscaria a conduta ideal, mas sim a conduta viável. Nesse contexto, aplicam-se não as melhores opções terapêuticas para cada um dos problemas, senão aquilo que se mostra possível de ser colocado em prática, sendo a visão integral do paciente a prioridade. Nesse modelo, a abstinência torna-se um elemento secundário e passa a se buscar um padrão de uso menos nocivo para o paciente.

Fica claro, nessa situação, o grande valor desse modelo de intervenção, comprometido com a redução dos prejuízos de natureza biológica, social e econômica do uso de drogas, pautada no respeito ao indivíduo. Trata-se de uma abordagem que tem se mostrado muito eficaz nesses propósitos, uma vez que são estabelecidas metas factíveis, com a participação ativa dos pacientes e de toda a equipe envolvida em seu manejo. Constrói-se, assim, um vínculo de confiança e respeito, no qual é valorizada a autonomia do sujeito que se coloca à disposição da equipe.


Dentro dessa proposta, o plano terapêutico é permanentemente reavaliado e os objetivos estabelecidos são constantemente revisados, respeitando-se sempre a possibilidade de realização e transformação do paciente a cada momento, minimizando, dessa forma, a frustração, aspecto a um só tempo comum e prejudicial à clínica da dependência.

Com tudo isso, a equipe objetivaria propiciar uma vida mais saudável, na qual, embora condições médicas graves ainda estejam presentes, estas estão controladas e o paciente pode desfrutar de autonomia e liberdade para se autodeterminar e desempenhar seus papéis sociais.

Especialização em Saúde da Família
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