As crenças e valores de como cuidar de pessoas que usam drogas, e de uma forma geral das pessoas com sofrimento mental, ainda sofrem influências de determinados modos de pensar que valorizam a medicalização, a internação, dentre outras estratégias possíveis. Exemplos desta realidade estão explícitos no trabalho de Lucchese et al (2009), quando, ao entrevistar um profissional da atenção básica, ouviu “O atendimento na área de saúde mental feito na unidade acaba se restringindo à medicalização...” (p.2036), traduzindo uma forma de cuidar. Importante notar também, que no mesmo artigo, agentes comunitários de saúde disseram: “Tem um sintoma diferente do outro. Nenhum é igual. Assim como todos nós... a gente tem as nossas diferenças. A gente tem que trabalhar com diferenças” (p.2039) e também “... Eu chego na casa dela, começo a conversar com ela, assunto que não tem nada a ver, às vezes até sobre o quintal, da casa dela, algum assunto, de repente ela tá sorrindo e passa aquela agressividade” (p.2039).

Reflexão

O reflexo clínico da proposição de diversificação de respostas se dá no cotidiano do cuidado destas pessoas. Por exemplo: quantas vezes já ouvimos que o fulano foi internado 8 vezes e voltou a usar drogas? Em quantos momentos percebemos que o usuário sob nosso cuidado necessita de uma intervenção que o nosso serviço não oferece? Qualquer profissional que trabalha na ponta já se fez estas perguntas. Por outro lado, o contrário também é recorrente. Quantas vezes encaminhamos um usuário para outro serviço antes mesmo de conhecê-lo?

Reflexão

Da mesma forma que as alternativas sanitárias são múltiplas, os resultados esperados a partir delas são diversos, consequentemente. A abstinência é apenas um deles, apesar de ser considerado como o principal resultado a ser buscado. No entanto, como esperado, as respostas aos tratamentos variam de pessoa para pessoa e as taxas de abstinência prolongada não são altas (MARSDEN et al. 2009). Neste sentido, é fundamental que sejam considerados como “sucesso no tratamento” outras características, além da interrupção do consumo de drogas.

Por exemplo, se associamos outros marcadores como funcionamento social e pessoal, riscos de segurança e saúde pública, propostos pela Organização Mundial da Saúde, a avaliação dos resultados do tratamento certamente fica mais complexa, mas, ao mesmo tempo, mais ampla. O tratamento pode ser considerado como bem sucedido mesmo se o consumo se mantém no mesmo nível ou reduzido. Exemplos: se o usuário continua indo ao serviço de saúde mesmo se há mudança na via de administração da droga (de injetada para fumada), se retomou vínculos com pessoas afetivamente importantes, se é possível voltar a estudar ou trabalhar. Em todas estas situações, compreende-se que a pessoa que usa drogas, progride em outros domínios da vida, aumentando sua qualidade de vida.