A transformação da saúde em bem de consumo traz grandes desafios para os gestores em saúde. Cada vez que surge um tratamento novo, ou um equipamento novo (às vezes para responder a necessidades que podem nem mesmo ser de saúde, como as cirurgias plásticas estéticas), as pessoas têm o desejo de adquiri-lo.
Assim, tratamentos de alta complexidade devem ser instituídos para garantir a vida, e não para responder a necessidades de consumo, o que faz com que nem todo tratamento disponível deva ser oferecido a todos.
O surgimento da Política Nacional de Humanização da assistência, que dentre outros itens incorpora o acolhimento, representa um desafio para os profissionais da saúde. Implica mudar a forma de atenção ao paciente do modelo biomédico para o modelo do cuidado.
Muitos de nós fomos formados seguindo o modelo biomédico, que privilegia o estudo das doenças, fragmenta o ensino em especialidades e assim enfatiza a formação técnica em detrimento da formação humanística e ética. Esse modelo reduziu o ser humano ao seu organismo biológico, levando os profissionais a serem vistos como simples prestadores de serviços.
A superespecialização na área da saúde atribui à doença um valor superior ao valor do doente. Se por um lado esse modelo favorece o desenvolvimento de materiais e técnicas, por outro traz o desafio de combinar esses avanços com as necessidades das pessoas, das sociedades e com seus valores morais.
Apesar de não ser possível nem desejável fugir dessa superespecialização, é preciso considerar os inconvenientes que ela pode trazer, como a perda da visão das pessoas como protagonistas do processo de cuidado na saúde.
Ao reduzir o corpo ao seu componente biológico, a saúde acaba por ser confundida com um bem que pode ser oferecido nas prateleiras, como uma mercadoria, o que dificulta o real entendimento das necessidades em saúde. A harmonia entre as diversas dimensões do ser humano (física, psíquica, social, espiritual) fica perdida se a busca for sempre a de solucionar problemas de natureza biológica.
A fim de aliar a excelência técnica ao compromisso social, é preciso prestar atenção integral mais humanizada, trabalhar em equipe e compreender melhor a realidade em que vive a população.
A Política Nacional de Humanização pretende valorizar as dimensões subjetivas e sociais das práticas de atenção e gestão em todas as instâncias do SUS, estabelecendo um novo modelo de atenção: o modelo do cuidado. Segundo esse modelo, a escolha da tecnologia a ser aplicada – leve (que incorpora o vínculo e o acolhimento) e/ou dura (que é composta pelos equipamentos) – deve ser consequência do cuidado e da atenção devidos ao paciente.